Vamos juntos despertar para um novo olhar?
Aqui compartilho conteúdos de outros autores para nossa reflexão ou, simplesmente, para inspirar o seu dia. Sobretudo, é um espaço dedicado à literatura, poesia, música, filosofia, ao cinema e ao que nos apresenta diferentes olhares sobre a vida.
Depois me conte o que está achando dos conteúdos.
O Fotógrafo
Manoel de Barros
Difícil fotografar o silêncio.
Entretanto tentei. Eu conto:
Madrugada a minha aldeia estava morta.
Não sei ouvia um barulho, ninguém passava entre as casas.
Eu estava saindo de uma festa.
Era quase quatro da manhã.
Ia o Silêncio pela rua carregando um bêbado.
Preparei minha máquina.
O Silêncio era um carregador?
Estava carregando o bêbado.
Fotografei esse carregador.
Tive outras visões naquela madrugada.
Preparei minha máquina de novo.
Tinha um perfume de jasmim no beiral de um sobrado.
Fotografei o perfume.
Vi uma lesma pregada na existência mais do que na pedra.
Fotografei a existência dela.
Vi ainda um azul-perdão no olho de um mendigo.
Fotografei o perdão.
Olhei uma paisagem velha a desabar sobre uma casa.
Fotografei o sobre.
Foi difícil fotografar o sobre.
Por fim eu enxuguei a Nuvem de calça.
Representou para mim que ela andava na aldeia de
Braços com Maiakovski – seu criador.
Fotografei a Nuvem de calça e o poeta.
Ninguém outro poeta no mundo faria uma roupa
mais justas para cobrir a sua noiva
A foto saiu legal
Fonte: BARROS, Manoel de. Ensaios Fotográficos. 4ª ed. Rio de Janeiro, 2003